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Que surpresa boa ter notícias tuas!
E tão inesperadas, depois de tantas promessas falhadas!
Foi um simples postal, sem muitas palavras, mas a imagem dizia tudo. Brilhante, colorida e - quase que posso jurar! - acompanhada daquele quentinho disfarçado de fresco que me sabe tão bem. Quando, logo pela manhã, abri as janelas para deixar entrar o dia, senti o teu cheiro, o aroma doce das flores que querem reaparecer, da terra ainda húmida prenhe de vida. E os passarinhos, querida Prima? Os passarinhos pareciam crianças no recreio da escola, numa algazarra de pipilares que abafaram os ruídos da cidade. Senti-me renascer, acreditas? Como se o conforto onde me resguardo do frio fosse a frágil casca de um ovo, deixando passar a luz do sol que me chamava baixinho, em tom de troça, desafiando-me para uma qualquer brincadeira de menina, daquelas que já esquecemos, horas e horas a saltar ao elástico (roubado da caixa de costura da minha mãe) ou equilibrada num só pé no jogo da macaca que desenhava com giz no meio da estrada. Lembras-te? Só quando tu chegavas é que nos permitiam tais aventuras. E quando te rias, nesse teu riso leve e cristalino como o dos bebés, deixavam-nos descalçar as meias e correr pela relva macia como um tapete feito de nuvens.
É quando recebo notícias tuas que percebo o quanto gosto de ti, o quanto me fazes falta. Não digas a ninguém, mas és a minha preferida. Não que não goste das outras. Adoro cada uma delas e tudo aquilo que me oferecem. A seu tempo, têm encantos que me fazem sentir bem. Mas tu tens o condão de me despertar, és aquela que me dota os olhos de curiosidades e expectativas. Tudo em ti me cheira a novo e até me esqueço dos anos que já vivi. Saber que estás quase a chegar é ouvir alguém dizer-me que a felicidade existe, que tudo é possível. Tens essa magia em ti. Como se fosses um colo do tamanho do Mundo onde todos os anos me aconchegas e repetes as mesmas histórias de encantar. Não há nada mais simples e puro que um colo assim. Não há nada mais mágico e sublime que o renascer da Vida, a redescoberta dos sentidos, dos prazeres inocentes e dos sonhos desprovidos de ambição. Quando tu chegas os meus dias cobrem-se de purpurinas cheirosas e brisas plenas de melodias. Quando tu chegas, minha querida Prima, eu sou só Sentir.
Foi um simples postal, com poucas palavras, que este Sábado entrou pela janela do meu quarto, nas asas de uma joaninha - velha amiga de infância - mas que me soube tão bem... Saí para o Sol e afadiguei-me nos canteiros, limpando-os das ervas, revolvendo a terra, retirando os restos do Inverno que ainda não partiu. Os melros, que apressados na construção dos novos ninhos, vieram, um a um, recolher tudo o que eu não soube tirar, disseram-me que eu tinha feito um bom trabalho. E mesmo a chuva, que entretanto resolveu aparecer, pareceu satisfeita com o resultado e caiu suave como se apenas quisesse enfeitar tanto labor.
Está tudo pronto para te receber, querida Prima.
A ti e às fadas que te acompanham para todo o lado e que brincam por entre as plantas que fazes crescer. Diz-lhes, por favor, que também já tenho saudades delas.
E não demores, não? Agora que tive notícias tuas, os dias já custam a passar.
Recebe um beijo enorme desta que te adora,
Maria Alfacinha