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Somos muito rápidos a julgar. Temos opinião sobre tudo. Sabemos sempre como os outros deverão agir. Adoramos dar conselhos. Não pensamos se será o momento para os dar, se nos conseguem ouvir, raciocinar, entender. Não reconhecemos a importância do silêncio, da não-resposta. Esforçamo-nos pouco por ver o lado do outro, calçarmos os seus sapatos. Mesmo quando acreditamos que o estamos a fazer, esquecemo-nos que não percorremos os mesmos caminhos, que não conhecemos os pormenores da viagem e não levamos a sério quem nos diz que tem medo do escuro, quem confessa não ter coragem, quem assume o cansaço. Confundimos o sentimento de impotência com inércia, fadiga com fraqueza, não-indignação com alheamento. Medimos os outros por aquilo que somos. Somos nós a medida-padrão, com os nossos defeitos e as nossas qualidades.
Mas não vemos, apenas olhamos. Não escutamos, apenas ouvimos. Ofendemo-nos com facilidade, exaltamo-nos, insultamos, agredimos, muitas vezes fisicamente. Não procuramos perceber o que leva alguém a agir de determinada forma e não paramos para perceber porque é que isso nos afecta. Reagimos automaticamente e como o fazemos sem pensar, achamos que somos honestos, sinceros, quase puros nas intenções. Quando contrariados – ou assim o cremos – retribuímos mais ou menos violentamente, na proporção inversa das nossas certezas e consideramo-nos no direito de o fazer. Acreditamo-nos correctos, sabemo-nos bem-intencionados e não admitimos que não o reconheçam. Por vezes espantamo-nos por não nos louvarem.
Não sabemos relevar. Adoramos castigar. Gastamo-nos a remoer no que nos fizeram. Perdemos o sono, arquitectamos vinganças, coleccionamos rancores, alimentamos raivas e irritações. Envenenamo-nos. Lentamente. Muito lentamente. Por vezes desforramo-nos e estranhamos o vazio que nos enche o peito. Enfronhados na velocidade dos dias que nos impomos - que aceitamos ou desejamos - resguardados na razão que cremos ser única porque justa, não nos apercebemos da melancolia que nos invade, chamamos-lhe cansaço, culpamos a vida, o tempo, a economia. E não percebemos porque não somos mais felizes quando temos tantas certezas que nos guiam.